Por Andreza Sichieri Mantovanelli Pestana Mota
Vivemos em tempos muito desafiadores para pais/mães atentos e responsáveis. O uso de telas por crianças, além de acarretarem dificuldades de aprendizagem, atrasos no desenvolvimento, dependência virtual, irritabilidade, problemas oculares, auditivos, transtornos do sono, alterações posturais, problemas de coluna e mais, expõe, sem filtro e sem critério, a conteúdos perigosos que levam as crianças, a curto prazo, a uma languida saúde mental. Hodiernamente é comum encontrarmos crianças apáticas, desinteressadas, ansiosas, violentas, que não conseguem esperar, ouvir o outro; além de apresentarem uma pobre qualidade no brincar, nas relações, sem capacidade de fantasiar, imaginar e agir.
Vale lembrar que as
crianças estão em plena formação física, cognitiva e emocional, e boa parte do
que se aprende e se faz são apreendidos, imitados ou assimilados no ambiente que vivem.
O uso de telas por
crianças, cada vez mais cedo, faz com que o ambiente de aprendizagem deixe de ser a casa, a rua, as pessoas, passando
ser um ambiente virtual, frio, ilusório
e cheio de perigos. Quantas vezes podemos observar em supermercados, por
exemplo, pessoas fazendo compras com crianças e estas com os olhos fixados em telas,
sem sequer saber onde estão? Ou em restaurantes, comendo, sem piscar diante de
um celular? Mesmo estando em diversos ambientes, acompanhando as famílias nos
mais encantadores lugares, as crianças não vivenciam o externo, o que é vivo,
de verdade. Ficam expostas a um ambiente com
padrões de vida e de beleza preestabelecidos, metas altíssimas de consumo, sem acesso
ao ser humano real como sua referência, como seu ambiente de aprendizagem.
O ambiente virtual faz com que as crianças se preocupem desde cedo em serem grandiosas, perfeitas, exibicionistas,
poderosas, com sentimentos de indiferença em relação ao outro. Sem contar a
normalização de comportamentos agressivos e violentos com os outros e consigo.
Por seus cérebros imaturos,
as crianças não estão habilitadas para interpretar,
digerir e administrar os conteúdos recebidos através das redes sociais,
filmes, desenhos inapropriados. O imaginário infantil somado à admiração
pelos influenciadores digitais ou personagens dos desenhos animados ou filmes inapropriados podem resultar na repetição de
comportamentos narcisistas, egoístas, violentos ou até de erotização
precoce. O grande perigo é que nem sempre esses conteúdos são tão claros e
evidentes; o eufemismo de tons coloridos suaves, as trilhas sonoras agitadas ou
fofinhas, muitas vezes corroboram com a inibição de quaisquer aspectos
negativos e nocivos.
O ser humano é um ser de movimento
e as crianças precisam movimentar-se para perceberem-se no espaço
tridimensional, ancorarem-se em seus corpos para um bom aprendizado durante
toda vida escolar. É importante que corram, subam em árvores, balancem, girem,
caiam, levantem e se relacionem. Precisam aprender brincando a lidar com as pequenas
dores da vida para desenvolverem empatia e compaixão. No mundo solitário das
telas é impossível vivenciar com alegria os movimentos. Tanto o movimento cósmico (dia e
noite, estações do ano), como o movimento anímico (relações pessoais) e de seus próprios
corpos. Se não tiverem supervisão, crianças e adolescentes perdem totalmente a
noção do tempo diante das telas e são capazes de ficar por horas sem se
movimentarem e sem perceberem o mundo ao redor. As crianças precisam de atividades
variadas de motricidade grossa e fina, principalmente aquelas com sentido, pois
os movimentos automáticos atrofiam o sentido do movimento.
A alienação causada nas
crianças pelo uso de telas impede percepções simples como dos próprios limites,
do bem-estar, de executar e perceber movimentos. Assistimos a uma hipotrofia
dos sentidos, que fatalmente ocasionará sérios problemas de convivência e
relacionamentos, prejudicando toda vida futura.
A orientação da Sociedade Brasileira
de Pediatria sobre o “tempo ideal de tela” para a população pediátrica é
diferente para cada faixa etária. Para crianças menores de dois anos, a
recomendação é evitar por completo a exposição a telas. Já crianças com idades
entre dois e cinco anos, a indicação é limitar o tempo de telas ao máximo de
uma hora por dia. Entre seis e dez anos, o tempo aumenta para duas horas diárias.
Para os maiores, a orientação é de três horas por dia. Esses períodos diários
sempre devem ser acompanhados por um adulto.
Uma ferramenta de proteção à infância
é a classificação indicativa, cuja
aplicabilidade melhorou consideravelmente nos últimos tempos.
Vale frisar que o cérebro maduro da relação com filhos é do pai/mãe, do
adulto que deve cuidar e avaliar a pertinência do uso de telas, o tempo de exposição
e o conteúdo que será oferecido para as crianças. Além disso, ao se depararem em
qualquer ambiente, virtual ou real, com violência, erotização, falta de
respeito, conversem com as crianças para que aprendam a rejeitar e reprovar um comportamento
negativo mesmo se este for retratado de forma colorida e divertida.
Os desafios estão postos. Sabemos
que não é fácil nadar contra a maré, mas, sabendo que é necessária uma aldeia
inteira para educar uma criança (provérbio africano), vale a pena investir no
convívio com pessoas que debruçam sobre o tema e carregam o mesmo impulso de
proteger a infância e a adolescência, mantendo a confiança em um mundo melhor.
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