10 de out. de 2011

Resenha do Livro "Clarear - A Pedagogia Waldorf em Debate"

Para quem leu o Livro "Clarear - A Pedagogia Waldorf em Debate" e ficou, como eu, um tanto "incomodada" com suas lacunas e com as consequencias deste trabalho "incompleto" segue o link de excelente resenha que comenta a 1ª Edição.

O autor da resenha não é ninguém menos que Valdemar Setzer e a revisão da redação é datada de 19/09/2011.

Boa leitura!!!



9. Conclusões

Esta resenha partiu do princípio que os relatos são objetivos e fiéis à realidade, e não interpretações pessoais; quando cabia, foram colocadas dúvidas a esse respeito. Partiu também do princípio que a autora teve contato estreito com várias eW, e que os relatos são de pais também de várias escolas. Baseado nessas premissas e no conteúdo do livro, cheguei às seguintes conclusões:
  1. O livro trata, claramente, de problemas entre professores e alunos, e professores e pais, para citar a expressão de Ruy Cézar mencionada no item 3 acima. O texto não trata de problemas gerais da pW e sim de algumas escolas, como a relativa falta de controle sobre a atuação dos professores, especialmente os de classe. Minha maior objeção é o livro dar uma impressão de ser uma crítica à pW, quando em realidade ele contém uma constatação de fatos e consequente crítica a certos professores e certas eW. Uma generalização indevida permeia o livro.
  2. Minha segunda objeção ao livro é o fato de os relatos do item 5 trazerem exclusivamente a opinião dos pais, sem ter apresentado a visão dos professores correspondentes. Os leitores podem avaliar a importância disso comparando o relato do item 5.1, feito pela autora do livro, com o depoimento da professora de seu filho, no apêndice do próximo item desta resenha.
  3. O nome do livro está errado. Ele não coloca a pW em debate, coloca algumas eW e alguns professores W em debate.
  4. Nota-se uma certa incoerência entre a admiração que a autora diz professar por essa pedagogia e suas atitudes de parar de frequentar o seminário pedagógico e tirar sua filha da escola no fim do jardim da infância. Afinal, o problema por ela relatado passou-se, segundo ela, somente entre seu filho e sua professora. Isso faz conjeturar que há algo mais profundo, negativo, na relação dela para com a pW e talvez para com a Antroposofia, o que, por exemplo, é confirmado pela menção do livro de Colin Wilson, conforme comentado no item 6 acima.
  5. O fato de seres humanos, os professores e os pais, serem falhos, não diminui a importância e os bons resultados da pW. Pelo contrário, mostra uma de suas facetas mais importantes: a liberdade que ela dá aos professores. Liberdade pode ser mal ou bem usada, mas é essencial que os professores a tenham, como expus no ítem 6.
  6. Nenhuma eW é perfeita, pois depende de seres humanos. A autora apontou algumas possíveis falhas. Há várias outras. A mais gritante em minha opinião é a falta de identificação de vários professores com a Antroposofia, quando não são frontalmente contra ela; conheço alguns desses últimos casos. Sem essa identificação, a pW torna-se mera técnica de ensino, como exposto no item 4. É muito possível que essa situação se aplique a vários dos professores mencionados nas "histórias" relatadas pela autora. Se for esse o caso, novamente a culpa não é da pW, é dos professores e das escolas, que não exigem aquela identificação e o estudo constante da base conceitual da pW, como aliás foi recomendado em um dos relatos (V. 5.9).
  7. A escolha de Ruy César para prefaciar o livro teve o mérito de envolver alguém estranho à pW; no entanto, nota-se a dificuldade de uma pessoa nessas condições, sem grandes conhecimentos dela e de Antroposofia, comentar algo referente à pedagogia e a Steiner. Talvez tivesse sido melhor alguém profundamente envolvido com a pW e a Antroposofia fazer o prefácio – se é que alguém com essas características iria concordar em assumir essa tarefa, face ao conteúdo do livro.
  8. Apesar dos pesares, os problemas relatados são relevantes. Nesse sentido, recomendo que todos os professores e todos os pais de eW leiam esse livro, refletindo se o que ele relata identifica-se de algum modo com suas próprias pessoas – o que lhes deveria levar a tentar mudarem-se a si próprios e suas atitudes –, bem como as suas escolas. Os casos relatados deveriam ser tema de debates nas eW pelo corpo de professores, suscitando a pergunta: há algo de semelhante ocorrendo entre nós neste momento?
  9. Em termos de perigo para a pW, a autora não aborda certas questões fundamentais, como a possibilidade de descaracterização geral de algumas eW em relação àquela pedagogia. É interessante notar que todos os casos que ela relata como negativos são desvios em relação ao ideal da pW. Mas são casos pessoais, pontuais; ainda não representam um desvio generalizado de uma escola em relação aos princípios da pW.
  10. Com o que não posso de modo algum concordar é que o livro seja público, como citado pela autora na p. 29. Ele deveria ter sido editado como material de estudo, vendido exclusivamente em eW e nos seminários de formação, e não como livro vendido em livrarias. Qual é a reação de uma pessoa que não tem a mínima ideia do que vem a ser a pW ao lê-lo? Provavelmente adquirirá uma péssima impressão da pW, pois o seu cerne trata de problemas, e não de resultados positivos, como os que se pode ler no excelente trabalho de Wanda Ribeiro e Juan Pablo [19] entrevistando cerca de 100 ex-alunos formados na EWRS, citado na p. 37. No caso, os problemas não são da pW, como a autora devia ter mostrado caso a caso, e o que procurei fazer, mas problemas de seus professores e de pais; é possível que alguns dos últimos não souberam levar suas preocupações aos primeiros e às escolas. Não se deve também descartar que certas crianças realmente podem ser excessivamente problemáticas. Deve-se ainda considerar que há vários pais que fazem uma ideia errada de seus próprios filhos, ou idealizam-nos fora da realidade como já mencionei no ponto 6 deste item. Lembremos o que foi relatado no ponto 1 do item 8 acima: falta no livro, para o público em geral, uma introdução à pW e definição de termos do jargão W. Além disso, deveria haver uma avaliação da magnitude dos problemas, isto é, em média, quantos pais em cada classe sentem problemas como os relatados ou ainda outros. Sem isso, uma pessoa desavisada pode adquirir a falsa impressão de que esses problemas – relevantes – são generalizados, o que de maneira alguma é uma realidade. Qual é a reação de uma pessoa desavisada ao ler "Selecionei os relatos mais significativos dentre um universo surpreendentemente grande" (p. 32)? Pode ser que esse universo seja até "grande" em números absolutos, mas o que importa no caso é o fator relativo: quanto casos negativos como os que ela relatou ocorrem nas eW em relação aos casos positivos, em que a criança vai até o fim do ensino fundamental e talvez do médio? Provavelmente muitos pais tiveram paciência com problemas como os relatados no livro, e depois ficaram felizes por seus filhos terem ido até o fim dentro de uma eW. É importante frisar que há vários pais, enganados pela pressão dos vestibulares, que tiram seus filhos no fim do ensino médio W para colocarem-nos em escolas que ostensivamente preparam para esses exames; a esse respeito, veja-se meu artigo "Meu filho está terminando o ensino fundamental Waldorf, e agora?" [20].
  11. Note-se que a má impressão que o livro pode causar no público em geral atinge o "meio antroposófico" como um todo, como já exposto no comentário sobre a sua expressão "possíveis retaliações pelo meio antroposófico" citada no item 4.
  12. Faço aqui algumas recomendações para as eW, que podem ser tiradas do livro: 1. As escolas deveriam ter um esquema de chamar os pais periodicamente, pelo menos uma vez por ano, para perguntar, em caráter confidencial, se teriam algo a comentar em relação à escola e aos professores; confirmando-se algum problema, deve-se tomar providências rápidas e relatar aos pais o andamento para a solução do mesmo; 2. Deveria haver uma regra de que qualquer problema com uma criança deve ser comunicado imediatamente aos pais (cf. 5.8, p. 113). 3. Se há tutoria pedagógica de professores de classe, e assim mesmo ocorrem problemas sem que se tomem atitudes para saná-lo, o tutor deve ser mudado. 4. Havendo essa tutoria, deve-se orientar os pais do ensino fundamental a tratar sempre dos problemas de seus filhos primeiro com o professor de classe e, se o resultado não for satisfatório, com o tutor e, em última instância, com a comissão coordenadora do ensino fundamental (que deveria existir em cada eW); 5. Os professores e tutores (tanto os pedagógicos quanto os de classe) devem ser orientados a jamais recusar uma conversa com os pais, dentro de um tempo relativamente curto (cf. 5.8, p. 117).
Em resumo final, do ponto de vista interno à pW, o livro parece ser uma excelente contribuição para o aprimoramento das escolas, dos professores e dos pais, como é a intenção declarada pela autora na p. 38. Certamente há e sempre haverá muito a ser melhorado nas eW, bem como na adaptação da pW para a época atual e para o ambiente onde cada escola está inserida.

Nesse livro fica patente uma realidade: nas iniciativas antroposóficas: não se pode permitir nada mal feito, pois as forças adversas imediatamente usam as falhas para atacar a Antroposofia e suas aplicações. As eW deveriam conscientizar-se disso e fazer esforços muito grandes para sanarem as suas falhas. Em particular, a situação nas eW parece ser deficiente em relação a atitudes frente a professores inadequados e à participação dos pais, que devem ser mais ouvidos e esclarecidos.

Finalmente, do ponto de vista externo parece-me que o livro é um grande desserviço à pW e à Antroposofia, por induzir impressões errôneas das mesmas. Para o público externo a elas, em minha opinião o livro não clareia, obscurece.



http://www.sab.org.br/pedag-wal/artigos/resenha-clarear.htm

2 comentários:

  1. Olá a todas/os,

    Notem que o texto acima contém apenas o capítulo Conclusões da minha resenha sobre o livro "Clarear - A Pedagogia Waldorf em Debate". O artigo com a resenha completa estava no site da Sociedade Antroposófica no Brasil, que instalei em 1997 e do qual cuidei de todos os detalhes, como webmaster, até 2013. Nesse ano, a diretoria da Sociedade Antroposófica resolveu fazer um novo site. No entanto, fui excluído desse processo, de modo que o resultado aí está: os endereços do site antigo tornaram-se inválidos, como por exemplo o endereço mencionado no texto acima. Se eu tivesse participado da nova implementação, isso não teria acontecido. Assim, fui obrigado a inserir em meu próprio site os artigos que estavam no site da Sociedade Antroposófica. Para a resenha completa do livro em questão, veja-se portanto

    https://www.ime.usp.br/~vwsetzer/antrop/resenha-clarear.html

    Valdemar W. Setzer
    13/6/14

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  2. Olá, Andreza,
    Na postagem anterior, faltou o último dígito do ano: 4. Por favor, insira-o
    aaaaaaaaaaa, VWS.

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